terça-feira, 26 de junho de 2012

A desgraçada suja e bêbada da Augusta (ou O texto Auto-Explicativo).


Em São Paulo meu coração não é o mesmo em noites assim, há muita felicidade forçada por aqui. Seguindo pela rua, nossos olhos vão ficando turvos, diminuem de tamanho.
Na calçada de uma loja de produtos eróticos havia um cara sentado, encostado na vitrine, com um caderno em uma mão e caneta em outra escrevia. Sem ler seus versos eu pude imaginar tudo que ele relatava naquele pedaço de papel, então senti uma vontade imensurável de juntar-me a ele. Já que escrever tem sido a única saída logo eu estaria expelindo versos com bafo de vinho.
Sorte em termos neblina às vezes, deixa o clima mais cinematográfico, a garoa que apaga aos poucos o brilho da vista dos prédios e do relógio grande lá em cima, em frente ao Safra. Isso tudo me transmite aquele sentimento de boa vida momentâneo que a vista nos proporciona. A visão panorâmica dessa superfície de concreto permite sentir  as nuvens despencando nada densas e é preciso quase fechar os olhos para focar objetos mesmo à distâncias curtas. Pra focar gente entupida de tóxico e que precisa fazer dele um aliado para sobreviver, os caras perdidos querendo se aproveitar de alguma forma, as putas pagas ou não, os mendigos, os vendedores de cerveja a três reais. Deve ser a dor que torna essa cidade mais elegante, e eu a devo amar por uma espécie de pena.
Aqui não é permitido esquecer. Então mando mensagem de madrugada cheia de cachaça na cabeça pra dizer que estou na zona sul e narrar quaisquer outros fatos (deixando claro que tudo ali a faz lembrar dele) torcendo pra que não fique puto e ache no mínimo engraçado. Ao menos fui discreta, e não tentei ser a poética chapada, como faço nos outros dias numa tentativa falha de impressionar. Seria interessante saber como se sente quando alguém é capaz de lembrar-se dele enchendo a cara pelas sarjetas da Frei Caneca. Nesse estado eu sou capaz de ouvir até Alcione. Vai ver não é paixão, é vontade. Isso tudo não dará em nada, mas ao menos me rendeu bons escritos.
Realmente não espero nada dele, nem que entenda, nem que mude, nem que se preocupe, nada. Nada apenas. Pode morrer se quiser, porque essa melancolia não tem nada a ver com ele. Talvez só comigo que a qualquer momento poderia cessar o movimento, afinal, ninguém supõe, mas essa calma é imagem e superfície.
São Paulo, não me venha ferir com tua beleza, não venha prometer qualquer sobriedade, encarar a realidade ainda é muito triste e não sinto esse frio que ouço tanto falar por culpa (ou graças ao) alto teor de álcool. Se não eu teria que buscar a religião ou a auto-ajuda ou o suicídio... O dia ameaça amanhecer e o céu começa num tom acobreado da cor dos meus cabelos. O caminho de volta a cidade é sempre o mesmo e o mesmo batom borrado cor de caqui. E não há o que se preocupar. Eu juro. Não há. 

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